Thursday, December 10, 2009

Segredo

Você não tem nem ideia

do que provoca em mim

não deixo você saber

pra não te dar esse poder.

Dias chuvosos

O sol insiste em penetrar as nuvens chumbo

deixa chover, deixa molhar.

não é hora de azul

toda cor tem sua vez.

Thursday, December 3, 2009

Casa nova

Nada como ser bem relacionanda nessa vida, né?


Rafael Maia, um designer fodástico que eu amo de paixão, ouviu meus lamentos e deu uma repaginada na minha casa.

Estou apaixonada com a décor.


Rafa meu amor,


Amei. Amei. Amei.


Obrigada!


E quem quiser ver mais do trabalho desse designer que acaba de voltar da espanha, acesse (aproveitem que agora ele tá no Brasil):


http://rafael-maia.com/


Wednesday, December 2, 2009

Só os cães são felizes

Outro dia recebi um email daqueles bem cafonas, com um texto tenebroso falando sobre o amor pelos cães. Claro que fiz piada e pus pra fora todo o meu lado insensível, que sempre aparece quando o assunto é baranguice.


Hoje, no auge da minha TPM passei em frentre a uma pet shop e vi um filhotinho de pincher preso numa daquelas gaiolas/jaulas em que colocam os pobrezinhos. Fiquei hipnotizada pelos olhões tristes do cão e entrei na loja. Na maldita jaula havia uma placa " não toque os animais". Que raiva que me deu. Dava pra sentir que o bicho precisava de carinho.


Como eu não podia tocá-lo fiquei como uma boba fazendo gestos, caras e bocas e chamando-o de meu amor, fofura, lindeza de modeuso, até mandar beijo pro animalzinho eu mandei. E ele todo bonitinho balançando o rabo pra mim.


Quando caí em mim, todos os funcionários da loja estavam me observando. Ai que vergonha! Despedi do cão (tchau coisa mais "gotosa" da mamãe) e logo descobri quem é que está precisando de carinho.

Wednesday, November 25, 2009

Atraso

O jardim estava um pouco diferente da última vez que esteve lá, há alguns meses, mas era a mesma casa. Tocou a campainha. Na mão esquerda trazia um girassol, que escondia nas costas.

Aquele homem visto de trás com a flor daria uma bela foto.

Uma voz metálica de mulher saiu do interfone:

- Pois não?

- Eh... Lúcia?

- A Lúcia não mora mais aqui.- respondeu a mulher com segurança.

- Como não? Ela nem me avisou!

- Sinto muito, mas não tem nenhuma Lúcia...

- Espera um pouco. Não estou acreditando, você pode aparecer aqui fora só um pouco?

- Olha, eu estou ocupada...

- Só um minuto, queria deixar algo caso um dia ela apareça.

- Ok, mas só um minuto.

A mulher foi calmamente até o portão, tinha uma feição blasé.

- Lúcia?! É você! Porque mentiu pra mim?

- Não menti. Não sou Lúcia. Pra você, sou Luzia. Prazer.

Monday, November 16, 2009

40 graus

Nossas barrigas
coladas de suor
respiram juntas.

Wednesday, November 11, 2009

Música boa

Lá pelas tantas na boate, já bêbada de tanta cerveja, andava sorumbática, até que seu amigo gay a alertou:

- Olha o gatinho ali, e é HT, viu menina?

Aproveitou da sua borrachera para dar um oi.

- Oi!

- Oi!

Ela saiu fora, ele a puxou pelo braço:

-Volta aqui.

E muitos blá blá blás depois, ficaram.

Bêbada, ela ficava atirada, e ele encantador, ou talvez fosse só uma ilusão de álccol.

- Vamos lá pra casa?

- Onde você mora?

- Aqui perto, num condomínio em Nova Lima.

- Ah, será? Você tem computador lá? Só vou se você deixar eu te mostrar uma música do meu mp3 player.

- Tenho um som lá. Serve?

- Mas toca mp3?

- É... não sei, a gente pode tentar.

- Ok.

- Vamos no meu carro?

- Não, prefiro ir no meu.

E ela foi seguindo o rapaz.

Chegaram na casa, que mais parecia uma casa de campo com quadras, piscina e nenhum móvel, só uma cama box de casal.

- Você mora aqui?

- Não, na verdade, essa é a casa de campo dos meus pais.

- Hum...

O som era daqueles microsystems velhos, que nunca teria uma entrada USB.

Na falta de música, foram para o único móvel da casa e lá permaneceram a noite toda.

De manhã acordaram e conversavam coisas banais e engraçadas. Até que ouviram barulhos pela casa:

- Parece que não estamos sozinhos.

- Putz, são os meus pais!

- Mas eles são tranquilos?

- Não. Nenhum pouco.

- Ai que vergonha! Vou pular a janela.

- Se quiser eu trago seu carro pra cá, você faria isso por mim?

- Acho que sim, essa situação seria embaraçosa, né?

- Sim, muito.

Beijou-a novamente e perguntou:

- Você tem namorado?

- Não, por quê? Você tem namorada?

- Tenho.

Ela tentou fingir a cara de surpresa, mas não se sabe se conseguiu.

- Ah é? E namoram há muito tempo?

- 3 meses.

- E cadê ela?

- Deixei ela em casa e saí. Muito chata. Muito carente.

- Hum.. Aqui, já tá ficando tarde, melhor eu ir embora.

- Ok. Vou trazer seu carro pra perto da janela, tá?

- Ah não, pode deixar. Vou pela porta da frente mesmo.

- Tem certeza? E os meus pais?

- Tem problema não, querido. Vou adorar conhecê-los.

Ela vestiu a roupa da noite anterior, arrumou a maquiagem e saiu se sentindo poderosa.

Os pais do garotinho estavam cozinhando o almoço.

Ela foi até a mãe, se apresentou, deu um beijo e um abraço.

- Almoça com a gente hoje - convidou a mãe.

- Não mãe, ela tem compromisso.

- É, hoje eu tenho compromisso, mas fica para próxima. A propósito, o seu jardim está muito bem cuidado.

- Obrigada - a mãe sorriu orgulhosa.

O pai do garotinho olhava aquela cena com a cara mais constrangedora do universo, como se já tivesse passado por algo semelhante, e não foi tão receptivo com a garota petulante, mas mesmo assim, ela não se deu por vencida, foi até o velho babão e o cumprimentou com um dos seus sorrisos mais cativantes e irônicos, claro. Ela estava se divertindo.

O menino de 30 anos a levou até o carro.

- Você tem meu telefone. Pode me ligar.

- Ah, mas que bom que eu posso. Obrigada, pode esperar.

E despediu do bebezinho com um beijão que constrangeu aquele almoço de domingo.

Entrou no carro, apagou o telefone do bebezinho, ligou o som no talo e ouviu sozinha a música que tanto queria ouvir na noite passada. Chegou a uma conclusão: música boa não é para qualquer um.

Monday, November 9, 2009

Na praça

Saí mais cedo de casa para evitar o trânsito. Calculei mal, ainda faltava uma hora para a minha homologação. Já que estava longe de casa mesmo, resolvi esperar. Pensei em tomar um café mas estava quente. Fui para a praça da Liberdade, lá tem sempre uns banquinhos livres e sombra.

Ao contrário do resto da cidade, lá ventava e era gostoso sentir o vento retirando os fios de cabelos que caíam sobre meu rosto. Havia muito tempo que eu não sabia o que era estar à toa no meio da tarde sentada em um banco de praça. Esta sensação boa acabou logo que a vergonha e a culpa invadiram a minha mente. Não me permiti desfrutar desse momento mágico às 3 horas da tarde. Tive medo de encontrar conhecidos e ter que me justificar. Que ideia! Que dependência do olhar dos outros.

Na praça havia somente estudantes em seus uniformes, hippies e velhinhos aposentados passeando com seus netinhos. Muitos carrinhos de bebês e crianças aprendendo a andar. Um garotinho que nem 1 ano devia ter veio cambaleante em minha direção, com um olhar sério e fixo. Olhava tão dentro dos meus olhos que era como se eu fosse um fantasma e só ele poderia realmente me enxergar. Mesmo sem dar nenhum sorriso, aquele olhar era puro, não havia julgamentos nem segundas intenções. Aquilo subitamente me encheu de emoção.

Passado o encantamento pela despretensão do menininho, veio um aperto no coração em saber que enquanto ele aprendia a andar, também desaprendia a olhar com os olhos e passava essa função para a cabeça.

Respirei fundo e deixei o mal estar passar. O pior não é ver com a cabeça, é se enxergar no espelho dos olhos dos outros.

Tuesday, October 27, 2009

Portrait in black and white

Ladys and Gentlemen,

Chet Baker in Portrait in black and white.

(alguém sabe colocar mp3 pra tocar no blogspot?)

Na falta de mp3, vamos de you tube.

Parte 1 (sim, a música é enooooorme)

http://www.youtube.com/watch?v=GQAWDXbBZXo

Parte 2

http://www.youtube.com/watch?v=z09wX8tLYUk&feature=related

Monday, October 26, 2009

A mais do meu itunes

Era uma manhã chuvosa, entrei naquele café para tomar meu último capuccino em Berlim. Ela já estava pela metade mas era linda, e muito familiar, lembrava algo do meu país. Perguntei à dona do café que música era aquela.

- Portrait in white and black. Beautiful isn’t it?

Mas é claro! Era isso mesmo. Retrato em branco e preto. Mas havia uma coisa diferente nela, algo que nunca senti quando a ouvia.

- And who’s playing?

- Chet Baker.

Fiquei até o final dela, que tem quase 16 minutos de duração. Hoje, vindo para o trabalho e ouvindo a música, cheguei à conclusão de que o único motivo pelo qual Tom Jobim e Chico compuseram essa canção foi para que Chet Baker a gravasse anos depois. Desculpe-me a todos que já a interpretaram e aos próprios Tom e Chico, mas Chet transcedeu não só a letra como também a melodia, aliás ele criou outras melodias dentro de Retrato em branco e preto. Ele consegue fazer uma reviravolta de sentimentos dentro das frases. Ouvindo, consigo sentir melancolia, desespero, solidão, revolta, e um tipo de força que cresce dentro de mim como se eu quisesse vomitar tudo que não me faz bem. É lindo demais. E todas as vezes que ouço fico tocada.

Fico pensando em como Chet Baker conseguiu despejar tudo isso dentro de uma canção. Para mim é uma das catarses mais bonitas que já ouvi.

Para quem quiser ouvir, é do disco Live in Tokyo de 1987.

Tuesday, October 20, 2009

Começando a entender o livro, visse?

Tudo começou com olhares, tímidos dela e descarados dele. Depois de dois mojitos ela arriscou um sorriso. Após muitos olhares e sorrisos ele se aproximou.  

- Oi, tudo bem?
- Sim, de onde é esse sotaque?
- Sou do Recife.
- Ah...
- Seu nome?
- Bárbara. O seu?
- Pedro.
 
Silêncio seguido de mais sorrisos e olhares. Na falta de usar a boca para falar usaram para se beijar. Bárbara sugeriu que saíssem de perto das caixas de som para tomar uma cerveja. 

- Mas o que você faz aqui?
- Faço mestrado em Direito Internacional.
 
Ele poderia ter falado sou coveiro no cemitério local, ou qualquer outra coisa, aquele sotaque de Pernambuco fazia com que ela prestasse atenção nas palavras separadamente sem dar importância para as frases. Que coisa boa de se ouvir. Não tinha nada a ver com francês, mas para ela, apaixonada pelo idioma, era como se fosse. 

Não se sabe como chegaram a uma papo cabeça despretensioso, não importa, era ótimo. Ele dizia: 

- Sou marxista.
- Ah, um romântico como eu. – e ela ria
 
Livros, relações internacionais e aquele sotaque. Tudo perfeito. 
O estabelecimento já estava fechando, então ele a convidou para terminar o papo no seu apartamento. Ela nem conseguiu fazer-se de difícil. Pra que dificultar um momento de perfeição? Eles são tão raros... 

Chegaram na casa dele e para a sua surpresa ele colocou Take the A Train para tocar. 

- Duke Ellington?
- É. Comprei um box de cds dele, para conhecer e por causa das capinhas, são bonitinhas, não são?
- Bonitinhas? Repete! Você não tá forçando não, né? É assim que você fala mesmo?
- Bonitinha - e ele dava gargalhadas.

A forma como ele pronunciava o "ti" a encantava: Náutico, Atlético, bonitinha, sítio...
 
Ouviram músicas e conversaram até amanhecer. Sobre tudo e sobre nada. Dormiram. Mas às vezes enquanto se reviravam na cama, acordavam se olhavam com cara boa e voltavam a dormir. Bárbara teve sonhos deliciosos. Era gostoso dormir encaixada naquele corpo, sentir aquele calorzinho, um cheiro diferente, carinho...

Devem ter descansado no máximo 3 horas. No dia seguinte, ou seja, no mesmo dia, acordaram. Ele, eu não sei, mas ela continuava sonhando.

E o sonho seguiu perfeito, porém os dois tinham compromisso no dia e tiveram que se separar. E se foram sem promessas. Foi um raro momento de perfeição que agora está imortalizado. Nenhum minuto a mais, nenhum a menos. Um presente do acaso.

Thursday, October 15, 2009

Cafés da manhã com Vicente

Seu Vicente tem insônia, ele dorme vendo jornal Nacional e acorda às 3 da manhã. Perambula pela casa com uns 3 livros e uma revista, lê um pouco de cada até que o sono volte. Lá pelas 6 ele acorda e vai à padaria, onde todos o conhecem pelo nome.

- Oi seu Vicente, Tudo bom com o senhor?

Vicente que acorda bem-humorado todos os dias, devolve o cumprimento com um largo sorriso, que faz qualquer mau-humor matinal parecer vergonhoso e caprichoso.

Chega em casa com o pão quentinho e come um pouco. Logo vai para seu escritório ler ou travar uma batalha com aquele monstro tecnológico chamado computador. Ouve passos na escada. Deve ser um dos seus filhos que acordou. Vicente senta à mesa novamente e põe-se a conversar com Filipe, que lê o jornal. Futebol e política são o assunto da pauta. Filipe sai para o trabalho.

Agora é a vez da filha mais velha, que sempre está apressada e desorientada, comendo em pé. O pai a tranquiliza e diz: calma, senta, toma café comigo.

- Você ainda não tomou?

- Não.

O sorriso desconcertante do pai vale um pequeno atraso no trabalho. A filha senta enquanto o pai na maior calma do mundo corta um pedaço de pão e passa manteiga. Conversam sobre outros temas. Falam em francês, ela conta algo do seu trabalho, mas vê que não pode demorar mais. Dá um beijo e um abraço no Monsieur Vincent e sai correndo.

A última é a Luciana, essa foi esperta, escolheu uma profissão que lhe dá mais tempo. Conversada como o pai, passa um bom tempo com ele falando desde como reduzir o valor da conta de telefone a suas próximas viagens e bolsas de estudo. Ela sai e Vicente acaba de tomar seu quarto café da manhã.

Já são quase 10 da manhã. Depois de cumprir todos os afazeres que ele escreve em uma listinha, Vicente espera os filhos chegarem um por um para mais 3 jantares. Depois diz que não sabe porque não emagrece.

Thursday, October 8, 2009

Procuro emprego

Canto, danço e represento.

Friday, October 2, 2009

Espere

Que mania de ser apressado que a gente tem em entender as coisas, procurar respostas imediatas. Ontem me aconteceu algo. Uma coincidência que parecia o encaixe de uma peça, feito pela mão de um ser superior brincando com o quebra-cabeças de sentidos que é o mundo.

Estava lendo A Imortalidade do Milan Kundera, que ganhei da minha cunhadinha. Demorei pra pegar no tranco, confesso, mas o livro foi ficando interessante. Até que em um capítulo, uma personagem, Agnes, fala de um poema de Goethe que seu pai sempre lia para ela. O poema estava traduzido para o português, claro, mas na página seguinte estava em alemão. Eu que não falo nada de alemão (mentira, sei uns palavrões), fui ler de curiosa que sou. Foi ver a primeira frase que caí dentro de um déjà vu. Fechei os olhos e ia adivinhando frase por frase.

O poema, nada mais era do que a música que eu mais gostava de cantar quando fazia aulas de canto lírico, há muito tempo. Gostava da música porque achava que ela deixava a minha voz potente. Na época nunca soube o significado daquelas palavras, com exceção de uma: warte, que quer dizer espere.

É um poema sobre a morte, sobre poder descansar. Sei que foi tudo uma grande coincidência, mas gosto de procurar sentidos ocultos nestes meros acasos. Ando cansada, infeliz, e querendo que tudo se resolva logo, hoje, agora. Mas as coisas se resolvem e passam a fazer sentido com o tempo, quando a gente menos espera – reza o clichê mor.

É verdade, eu nem procurava a tradução dessa música e um dia, sem mais nem menos, ela me apareceu dizendo assim: warte.

Tuesday, September 22, 2009

Mulher sem razão

As melhores decisões que tomei foram de impulso, aliás foram todas.

Friday, September 18, 2009

Madri e os 30



A Internet é mesmo uma caixinha de surpresas. Eu tenho um flickr onde coloco as minhas fotos de amigos, viagens, coisas que eu gosto e que não tem NENHUMA pretensão artística. É apenas um lugar para dividir com meus amigos os momentos, que de alguma forma, marcaram a minha vida.

Outro dia recebi um email de um tal de Schmap, um site de lugares turísticos do mundo. Eles viram uma foto minha da Plaza Mayor de Madri e perguntaram eu podia inscrevê-la num concurso, a mais votada representaria a Plaza no site. Hoje o Schmap me escreveu novamente: a foto foi escolhida.

E a foto não tem nada de mais no sentido fotográfico, mas tem um sentido emocional para mim gigantesco. Ela foi tirada quando eu fiz 30 anos, sozinha em uma cidade que “me pegou de jeito”. Talvez de todas as cidades que eu já estive, Madri foi a que mais me marcou, não por sua beleza, seus museus e o Parque del Retiro, mas por ter encontrado uma pessoa que não via há tempos: eu mesma.

Tuesday, September 1, 2009

Ode ao ódio

Cansei de odiar as mesmas pessoas.
Quero odiar outras novas.

Wednesday, August 26, 2009

O buraco que ficou

Antes que Nicole partisse pela última vez da casa de Leonardo, ele quis deixar uma recordação sua com ela.

- Toma, esse é o meu preferido.

- Não vai ter dedicatória?

- Ah, é claro, espera aí que eu vou fazer.

Enquanto ele escrevia, ela andava pela sua casa olhando tudo que não veria jamais. O sofá-cama aberto em frente a televisão, a estante com os mesmos DVDs, o baleiro, o desodorante e a foto da outra mulher que o abraçava.

- Toma, espero que goste. Nicole não via nenhuma verdade nos seus olhos, o que ela via era um alívio que dizia baixinho: vá logo. E foi-se.

No caminho para casa sentia-se aliviada também. Aquilo tudo era ilusão. Faltava muito em Leonardo. Nicole tinha certeza.

Leu a dedicatória do livro mais uma vez e a achou tão genérica... “te dou este livro porque é o meu preferido...”, palavras pobres em uma letra bonita. Nicole preferiu virar outras páginas. O predileto de Leonardo ficou na estante acumulando poeira. Ela tinha horror e medo de abri-lo e encontrar aquela dedicatória sem sal.

Quando ela deixou a casa dele se sentiu tão aliviada, onde se encontrava essa sensação agora? Pensava nele descuidadamente. Parece que o tempo desbotou sua razão.

Numa madrugada de insônia, levantou-se da cama e ficou parada de frente para a estante de livros encarando o “preferido”. De impulso, retirou o livro com violência e foi direto para a dedicatória. Nada tinha mudado. Aquelas palavras continuavam ridículas. Pôs-se a lê-lo.

Primeiro capítulo, nada. Segundo, nada, terceiro, quarto, quinto, sexto... nada. Não é que Nicole procurava respostas no livro? Foi se envolvendo, gostando do enredo e algumas respostas começaram a aparecer. Encontrou até seu personagem. Que decepção! Nicole era um buraquinho. Sim, esse era seu papel no livro. Ficou chateada com a comparação que ela mesma fez. Será que ele pensava assim? Pode ser, mas nesse caso a história é dele. E Nicole será um buraquinho que não foi escavado suficientemente.

Tuesday, August 25, 2009

Tá difícil...

Hoje, enquanto tomava café-da-manhã com meu pai, percebi que chuviscava. Vi um guarda-chuva preto e uma sombrinha preta de bolinhas brancas, ou poás, no cabideiro. Fui logo pegando a de poás, mas hesitei um pouco e perguntei para o meu pai:

- Será que a mamãe vai precisar da sombrinha dela?

- Não, essa é minha.

- Eu falo da de bolinhas.

- Pois é, essa é a minha.

- De bolinhas, papai?

- Ué, o vendedor falou que era de homem e que tava usando muito – disse meu pai com a maior cara de inocência.

Não me contive, e a gargalhada explodiu na cara dele.

- Pode levar, Carina. É sua, te dou de presente.

Ficamos rindo por uns 5 minutos.

Acho que é por uns motivos desses que eu não consigo deixar a casa dos meus pais.

Monday, August 24, 2009

Mentiras cor-de-rosa

Já estava tudo preparado. Eu chegaria em casa assistiria a um filme leve, um musical, e depois dormiria horas para concretizar o meu plano: dormir mais.

O filme era 8 mulheres do François Ozon. Achei engraçado ser um musical, o Ozon sempre faz filmes tão sérios...
Músicas deliciosas e irônicas embalavam aquela história de enredo tragicômico. Fin. Desliguei a TV e fui formir. Lá pelas 5 acordei incomodada, algo não me deixava relaxar. Não precisei pensar muito para chegar no que me cortava o sono.

Foram as verdades. Quando se diz que verdade dói não estão mentindo. E como dói. E o filme era uma enxurrada de verdades. É possível construir uma harmonia com pequenas e grandes mentiras. "Eu te perdoo". "Desculpe, meu despertador quebrou". "O pneu do meu carro furou".

Para que mentir? Esconder erros e imperfeições? Porquê? Medo de magoar? Medo de ser odiado? Odiado por quem? Que dependência é essa do amor e da aprovação dos outros? No filme tem uma canção que traduz bem isso: De que adianta ser livre se se vive sem amor? A quoi sert de vivre libre, interpretada maravilhosamente pela Fanny Ardant, em que ela simula um strip tease, que pode ser visto como uma metáfora para o "desnudar-se". Nesse momento ela se expõe e canta a sua verdade.

É bonito, mas muito triste. Quem vive demais a verdade tem a tendência de ficar só, porque é muito difícil aceitá-la e compreendê-la. Tem até uma frase na música Misread do Kings of Convenience que diz: The loneliest people were the ones who always spoke the truth.

No filme, os personagens escondem "seus erros" com mentiras, porque errar é inadmissível. Mesmo para humanos. Estranhamente, sabendo de nossas limitações, continuamos cobrando essa perfeição das pessoas a nossa volta. Não toleramos uma mentira, mas não damos conta da verdade.

Caramba, tô escrevendo isso há 3 semanas e não consigo terminar, e para piorar a dobradinha verdade-mentira tem me perseguido: é no Paulinho da Viola, é na TV, nos livros... estou me sentindo encurralada. Acho que fui meio prematura em jogar pedras nos mentirosos, porque não existe a verdade absoluta. Cada um tem a sua. E às vezes a mentira é apenas um carinho de quem não queria magoar tanto.

Monday, August 3, 2009

Aquecimento global

Esse mormaço de verão em pleno inverno. Nenhum vento balança os meus cabelos, muito menos a minha alma.

Friday, July 24, 2009

O arquiteto de exteriores

"Vou querer dois metros e meio de livros nessa parede, naquela ali pode colocar meio metro de clássicos, para a mesa de centro um livro de ilustração, importado de preferência.

Naquele espaço vazio pode colocar cinquenta centímetros da coleção de Bach pela filarmônica de Berlim, acho que vai combinar com a estante dos sambistas. Gosto dos contrastes.

No quarto, cama grande. Vou precisar. Por preguiça e por luxúria.

A sala dos fundos pode ficar vazia, ninguém entra lá mesmo".

Pequeno demais

Para cada um, uma música
For no one
Eu só quero saber de você
Vai-se o amor
Fica a canção
Cried for no one
Um dia a verdade chega
Absoluta
Sem os relativismos complacentes
E a gente ri
Um riso irônico
Triste por não ser alegre
Falso como o que se passou
Engana-se alguém?
Talvez os honestos
Os falsos se protegem atrás de sombras
Que deformam a realidade
Mas basta faltar o sol que morrem
E ninguém vai ao enterro
Morrem sozinhas
Sem ninguém para chorar
Mas não rio
Apenas ignoro
Quem? Quando?
Não lembro.
Tão pequeno que eu não senti.

Tuesday, June 30, 2009

Debaixo do tapete

Acordei decidida a limpar a minha casa. Inacreditavelmente estava sem preguiça. Liguei o som alto e comecei pela a cama, estendi o lençol azul, dobrei o cobertor, e cobri com a colcha que mais gosto.

O chão estava cheio de roupas, cintos, meias – como pude ser tão descuidada e ter deixado acumular. A aparência do meu quarto mudou, ficou muito mais habitável.

Banheiro, cozinha, tudo brilhando. Só faltava varrer. Odeio varrer, porque sempre sobra um pouquinho que não cabe na pá. Ou eu pegava um pano molhado para tirar o pó final ou simplesmente empurrava para debaixo do tapete. Como eu já estava cansada de toda arrumação, segui a lei do menor esforço.

Ficou linda a minha casa, nem conseguia mais imaginá-la suja. Dava até gosto de ficar em casa sentindo orgulho do meu trabalho. Dias depois deitei em cima do tapete para ver TV e comecei a espirrar, o pó continuava lá, era tão pouco, mas me fez tão mal. Levantei com raiva e passei o pano molhado no chão.

Continuei espirrando por algum tempo, meu olho até encheu de água, mas já passou. Tá passando.

Sunday, June 28, 2009

Sem cerimônias em desenho

Feitos por minha amiga, a talentosa e sensível Denise Schwenck.

http://www.deniseschwenck.blogspot.com/










Friday, June 26, 2009

Dans Paris

Era seu penúltimo dia em Paris, vivia algo diferente, um estado de euforia provocado pela beleza da cidade e as novidades. Mas seu coração às vezes apertava, porque ele não dava sinais de vida? Logo abafava esse sentimento e a euforia tomava conta novamente.

Foi a um jantar preparado por seus novos amigos. Muito vinho, comida japonesa. Os sabores antigos acionavam uma das suas melhores memórias, o seu intercâmbio. Depois música, muito Paolo Conte, cenas de filme, François Ozon. Tudo aquilo a deixava a beira de um ataque de felicidade.

Quando todos iam para casa ela pensou: não posso ir dormir agora, tenho que aproveitar até a última gota dessa alegria.

Seu amigo a deixou na frente de uma boite da cidade, o Club Social. Ela olhou para o segurança, deixou transparecer sua confiança e entrou. Não era a roupa que escolheria para dançar, nem o sapato, nem o cabelo.

Ali ela tinha outro nome, Valentina. Valente, mas a ideia de estar sozinha em um lugar onde não conhecia ninguém a assustava um pouco. Pensou no bar, lá além de tomar um drink, poderia conversar com o barman, nos filmes isso sempre dava certo.

Analisou o menu. Tudo muito caro para o seu orçamento, a bebida mais barata que conseguiu era 5 euros – um shot de vodka. Virou o shot e encostou o bar, inebriada pelas luzes e a boa música que saía das pick ups do dj. Não se passaram nem 2 minutos e um rapaz se aproximou em francês: posso te convidar para um drink? Sua visão escaneou o rapaz de cima embaixo. Era atraente, cabelos castanhos encaracolados, pele branca cheia de sardinhas. Valentina sempre gostou de sardas, pintas e afins. Ela aceitou a vodka com energético e puseram-se a conversar.

Primeiro assunto: de onde você é? Espanha? Itália? Alemanha? Estados Unidos? Austrália? Índia? Portugal? E dá-lhe geografia, e dá-lhe nenhum acerto.
Rindo ela disse Brasil. A palavra Brasil sempre causou um estranho efeito nos homens estrangeiros, blame it on Rio.

O papo conntinou, o que você faz? O que faz aqui? Quantos dias? Cinema. Música. Filosofia de boite. E danças, e risadas, mais vodka com energético, e fotos e vídeos, e conversas com os amigos do rapaz, e amizades de uma noite só. E beijo. E mais beijo e mais e mais e mais e tesão.

Frederique propôs a Valentina sair logo dali para o seu apartamento. Ela nem pensou duas vezes. Oui, bien sûre.

Saíram os dois loucos pela madrugada parisiense, enconstando nos muros, beijando-se com violência, derrubando motos, e chegaram ao apartamento.

Frederique morava em um grande apartamento que dividia com mais duas amigas. No seu quarto havia vários livros de filosofia, anotações espalhadas, um mapa mundi e um piano. A cama era confortável, ela já foi deitando e ele seguiu atrás, beijaram-se e terminaram o que haviam começado. Foi mais ou menos. Para ela valeu muito mais a aventura.

Depois de tudo Frederique contou que tinha uma namorada na Turquia e que se arrependeu do que tinha acontecido. Valentina não deu a mínima para o desolado arrependimento dele e mais uma vez devorou le garçon, que logo esqueceu sua turca e caiu em um sono pesado. Exausta ela pensou em dormir, a cama estava convidativa e fazia frio. Olhou-o, ele babava no travesseiro completamente apagado.

Não conseguiu pensar nem uma vez, vestiu sua roupa e nem se despediu. Achou a saída do apartamento e saiu pela manhã gélida de Paris. Todas as ruas e edifícios pareciam iguais. Como acharia a casa onde estava hospedada? Seguiu seu instinto que estava falando alto naquele dia, 10 minutos depois encontrou a rua. Subiu e dormiu.
No dia seguinte já não era mais a Valentina, era ela mesmo. Tinha adorado as aventuras da outra na noite anterior.

Valentina preferiu ficar em Paris, mas soube-se que às vezes ela vem ao Brasil de visita.

Monday, June 22, 2009

Sem cerimônias

Ela precisava voltar para ver como tinha deixado tudo. Abriu a porta e recebeu um abraço caloroso que causou pequenos terremotos em seu estômago, quase perde o equilíbrio. Não sabe se foi ele ou ela quem tomou a iniciativa do beijo, pouco importava, era recíproco.

Ele a mostrou um livro de gravuras que havia comprado, ela via as imagens fingindo um certo interesse, não queria perder seu tempo, queria ir pra cama dele que imaginava desarrumada com o lençol e o edredom enrolados. A cama desarrumada dava uma sensação de conforto. Lembrou-se de quando era pequena e a empregava faltava, encontrava sua cama toda revirada como havia deixado pela manhã, e se jogava nos lençóis, sentia a textura do algodão nas suas pernas, era um pequeno momento de felicidade.

Olhou para ele com cara de menina pidona, na mesma hora ele entendeu e fechou o livro. Pegou sua mão e a levou para o quarto.

Sentaram-se na cama e ele começou a despi-la, peça por peça, parou no sutiã, era um modelo novo, cruzado nas costas que ele ainda não conhecia, depois de analisá-lo o tirou e só ela poderia dizer como o rosto dele se iluminou ao ver seus seios que não eram grandes nem pequenos, brancos com a auréola rosada, que se destacavam do resto do seu corpo moreno de sol. Pegou-os com vontade e beijou-os. Ela se estremeceu, ver aquele prazer nos olhos dele a deixava cada vez mais excitada. Tirou a roupa dele sem o mesmo cuidado, ela precisava senti-lo, encostar cada parte do seu corpo no dele.

Aquela pele, o cheiro, tudo a deixava cada vez mais ébria. Agora ela era ela, senhora de si, sem fingimentos, sem interesses. Gozou mais rápido do que costume, já não conseguia segurar mais as fantasias que teve pensando nele por toda uma semana. Ele tão pouco conseguiu segurar.

Foi intenso. Foi explosivo. Foi a última vez.

Olharam-se e beijaram-se, ficaram grudados um ao outro pelo suor dos seus corpos. Ela não queria desgrudar, desejava que esse momento durasse pelo menos uma noite. Impossível, estavam em seus horários de almoço. Em pouco tempo teriam que voltar para o trabalho.

Ele foi ao banheiro e quando voltou a encontrou nua, sentada na beirada da cama, cantarolando uma canção que falava de um amor unilateral. Ele a olhou e fez um carinho tão terno que a emocionou, ressabiada perguntou: porque esse carinho?
Ele: saudade de você e da sua cantoria.

Apesar de tudo, ela sabia que não era possível ficarem juntos, não só porque ele não queria, mas porque ela descobriu que ele não fora feito para ela. Muito fechado, e só se abria durante o sexo. Ela tentava se abrir e ele não permitia, não queria saber. O sexo já estava de bom tamanho. Ela que gostava dos detalhes, da poesia, das complicações do ser-humano, das descobertas, não aguentou. Despediu-se ali mesmo, silenciosamente, mas ele escutou. Seus olhos de libanesa falavam mais que sua voz doce e meio rouca.

Saiu com os olhos molhados mas com um sorriso no canto dos lábios. Nada a deixava mais feliz do que uma decisão.

Tuesday, June 16, 2009

Andar sem sair do lugar

Todo dia ele fazia o mesmo caminho. Saía de casa, virava à esquerda, 20 m depois à direita e seguia reto toda a vida. Chegava ao trabalho, saía para o almoço pontualmente. Mesma mesa do mesmo restaurante barato. Café com os mesmos conhecidos, trabalho e o caminho inverso, toda a vida, esquerda, 20 metros e direita.

Um dia interditaram seu caminho, ficou perdido. Sentou-se no chão desesperado. Não conseguia ir para direita nem para a esquerda, tentou descer para debaixo dos seus pés, mas não foi possível. Depois de tanto tempo em pé na frente de casa descobriu um novo caminho, e mais outro, e mais outro e um monte mais. Uns eram mais interessantes, outros mais rápidos, outros perigosos.

Até que um dia, sem mapa, nem GPS viu um caminho diferente que nunca tinha visto, nem sabia que ele existia. Era um caminho cheio de música, cor e risos. Ele adorava esse caminho. Repetia todos os dias, andava por ele saltitando, estava feliz.

No dia seguinte o caminho colorido estava fechado para reformas, a placa dizia que era por pouco tempo. Ele pensou em esperar as reformas, mas passando pelo seu antigo caminho observou que não estava mais interditado. Sentiu-se esquisito, não sabia se passava por essas ruas sem cor que conhecia de cor. Olhou para o caminho colorido pela última vez e seguiu a direita, a esquerda e reto por toda vida.

Tuesday, May 12, 2009

Impressões de Algum Lugar, Mundo.

Letícia sai para uma caminhada em sua vizinhança e passa por estranhos, pessoas aparentemente marcantes que logo serão esquecidas.
Ouve barulhos de criança que vem de um grande parque a sua frente. Resolve entrar. O parque é sujo, cheio de papéis, restos de copos plásticos; nada que ela esperava encontrar a milhares de quilômetros de casa. Estrangeiros e locais dividem o espaço público em pequenas rodas de violão, ou de cerveja, ou de maconha. E ha os solitários como ela, que leem ou olham a paisagem.

Ela estende a canga preta e branca que havia comprado de um ambulante em uma praia da sua terra natal e deita na grama. Observa tudo e tenta encontrar um significado para este momento em sua vida. Não encontra nada. Abre um livro, lê um parágrafo. O livro é bom, não há duvidas, mas um pouco masculino demais para a sua sensibilidade.

Um pouco enfadada do livro, abre seu bloco de notas e com a caneta macia que ganhou de presente de formatura, põe-se a escrever.

Escreve para ficar alheia a tudo. Para ficar invisível para o resto e visível para si mesma. Lembra-se da noite anterior: músicas, sotaques, línguas, drogas, bebidas e Joaquim.

Tão perdido quanto ela, sóbrio no meio de tanta gente louca. A princípio Letícia não o notou, reparou mais em seu amigo Rafael, um belo exemplo da raça masculina. Joaquim era normal, mas depois de sua primeira palavra, sua beleza cresceu. Era inteligente, engraçado, atencioso e quando sorria mostrava os dentes e fechava os olhos. Ela gostava de ver as pequenas rugas que se formavam ao redor dos seus olhos castanhos.

Naqueles momentos juntos não havia o seu país nem o dele, muito menos a música e as pessoas ensandecidas. Só havia dois jovens rindo e fazendo uma salada de idiomas. E como nada é perfeito, Joaquim vai ser pai de uma garotinha em 2 meses. Foi bom. Uma desesperança que a encheu de esperança. Lembranças que vem como o vento.

Saturday, April 11, 2009

Com a faca e o meu coração na mão

Eu me entrego se você se entregar, senão nada feito
Só me mostro quando você parar de esconder
Fiquemos os dois deitados no escuro
Só falo se você perguntar
Estou sem vontade própria
Talvez esteja com medo
Espero algo que não sei que é
Isso vai acabar logo
Mas foi bom te conhecer
Saí da minha rotina, pus os pés no chão gelado da sua casa cinza, da cor do seus sentimentos
Sou capaz de me abrir, muito. Mas apenas depois do sinal
Pode ser que eu saia antes disso. Se você não quer entrar não tem problema
Na verdade não me importo muito. É tudo uma questão de vaidade que se cicatriza com o tempo.

A médium

Isabel sempre teve a irritante mania de querer adivinhar o que os outros pensam. Quando está ao lado de alguém, ela aperta os olhos, se concentra e fica bem calada para escutar alguma coisa. Silêncio completo. Assim ela passa para a segunda tática, os olhos. Ela os mira fixamente para tentar ler algo e o único que lê é seu próprio pensamento. Agora só lhe restam os gestos, e... nada. O que aconteceu? Ela é incapaz de adivinhar ou é ele que pensa em nada? Uma dúvida que corrói a cabecinha fervilhante de Isabel.

Wednesday, March 25, 2009

Boazinha pero no mucho

O código foi quebrado. O disfarce já não serve para nada. A fantasia é mais berrante do que as usadas no carnaval. Para que tanto esforço se se nasce nu e nossa nudez é o que realmente temos. Tudo um grande teatro com interpretações sofríveis para esconder o sofrimento. Que pena... pobrecita... Vai lá, coloque sua armadura prateada e parta para a guerra, mas não chore a sua derrota, ninguém te obrigou a lutar. A guerra é sua, inexistente, ninguém dá a mínima. Quem ganhou, quem perdeu? A mi me importa un carajo! Um dia isso passa, ou pode ser a sua eternidade particular, lo siento. Mentira. Foda-se!

Sunday, March 8, 2009

Chiaro oscuro

Fazia muito calor, era quase março e nem o auge do verão, janeiro, tinha sido tão quente quanto aquele dia. Nicole podia ter ficado em casa e esperado o calor passar, mas não. Preferiu encontrar seus velhos e bons amigos. Já estava disposta a transgredir as ordens do médico que a proibira de tomar álcool enquanto estivesse sob o efeito de anti-inflamatórios. Ela pensou “essa torcicolo está me matando, mas não quero perder este dia com meus amigos, nunca mais terei 29 anos no dia 27 de fevereiro de 2009. E isso era verdade, cada dia que passasse seria menos um dia de sua vida. Não que fosse morrer amanhã, mas não que não fosse morrer amanhã. Quem saberia... assim optou pela imortalidade, como sempre.

Inesperadamente tudo ficou claro, não claro de cegar, mas claro de esclarecer. Aí perdeu a graça e o sentido. Ficou óbvio que ela preferia a obscuridade, enganar-se.
Mas tudo bem, existem vários tons de claro, e os que ela conhecia eram todos desbotados, apenas resquícios de uma grande mentira, daí sua preferência pelo escuro. Mas tudo isso passou, talvez tenha sido sua culpa, não por maldade, mas por ingenuidade. Foi bom. Mais uma construtiva perda de tempo. Se aprendeu algo, foi só sobre aquele momento, agora ela volta mais uma vez para o preto total, que por sinal, adora.

Thursday, February 5, 2009

Tears for Dolphy

Nunca vi um filme que me deixasse tão agoniada quanto Teorema, não sei se é a música, Tears for Dolphy, que entrava toda hora queimando as minhas vísceras. Sempre que eu a ouço, acho-a parecida com uma marcha fúnebre, mas não consigo parar de ouvir.
Fico hipinotizada e coloco no repeat. E só quero escutá-la quando fico sem ação. Quando não sei o que fazer. É como se eu parasse só para ouvir a música na esperança que ela pudesse me purificar.

Outro dia, pesquisando sobre Tears for Dolphy descobri que o seu compositor, Ted Curson a fez em homenagem póstuma ao seu amigo Dolphy. Foi uma música catarse. Ele também devia estar querendo se purificar da dor de perder um amigo. É engraçado como nos encontramos na catarse alheia.

Em Teorema os personagens estão também paralisados, sejam em seus vícios, nas suas crenças, ambições ou loucuras. Todos esperando um anjo cair do céu para ajudá-los a escapar do sofrimento. Essas pessoas têm tudo, mas falta algo e é essa falta que as tornam tão miseráveis. O que é que falta? É amor? O anjo traria amor?

Alguém pode realmente trazer amor? Tão subestimado e ridicularizado o amor. Falo de um amor maior, interior, de algo que inunda sem deixar afogar.

Tuesday, January 20, 2009

Mais leve que o ar

Isso também é velho, já tem 3 anos. E não é que a profecia se cumpriu?

A casa abandonada dos meus pensamentos. Como uma onda me invade e se explode em choro. Um choro porque não cabiam palavras. Não se explica lágrimas. Elas apenas são. Agora sei que não quero voltar àquele lugar. Uma casa assombrada na memória que ainda pesa, mas vai se tornar balão.

Malditas músicas italianas

Escrevi isso há uns dois anos no blog de um amigo. Achei oportuno postar aqui de novo.


Há uns 2 meses estou igual louca tentando baixar umas músicas italianas dos anos 60 no Emule. Umas bem românticas. É engraçado, porque quando eu tinha 10 anos, viajei para a Pousada do Rio Quente com a minha família. Meu pai tinha uma Belina azul claro metálico, com aquele senhor porta malas, o chiqueirinho. Ele mandou fazer um colchão do mesmo formato pra meus irmãos e eu irmos deitados nas 10 horas de viagem.

O pessoal lá de casa sempre gostou muito de música, mas fomos despreparados pra viagem, levei uma fita cassete de alguma novela nacional da Globo – sim, eu era noveleira e comprava tudo quanto é trilha sonora. Minha mãe levou uma fita de músicas italianas (que na época eu achava que era francês). E fomos assim, 10 horas de viagem revesando as fitas. Na hora da música da minha mãe, a macacada (como meu pai chamava meus irmãos e eu) ficava reclamando, a gente torcia pra minha fita começar logo. Imitávamos o “francês” , zombando da minha mãe e essas coisas que crianças endiabradas adoram fazer. As músicas da minha mãe nunca saíram da minha cabeça.

17 anos depois, ouço essas canções e sinto algo tão bom, tão carregado de emoções e não sei se é pela lembrança da macacada no porta-malas acolchoado, ou se é porque agora entendo melhor as músicas, ou ainda, por que agora me entendo melhor. São músicas românticas demais, e é assim que eu sou: romântica demais. É um lado que tento negar tanto agora que o mundo é pragmático, os relacionamentos são superficiais e as pessoas são individualistas e egoístas. Não vou negar mais não. Sei que alguém ainda vai curtir Il cielo in una Stanza comigo, afinal românticos acreditam em finais felizes.

Café Latinita

Este conto é muito significativo pra mim. É de Andrew Talbot, um escritor inglês que conheci em Buenos Aires na noite do Reveillon, uma pessoa muito especial.

Café Latinita does not stand out. And nor should it; cafés like this hang on every corner in Buenos Aires: a selection of white plastic tables covered in white table cloths surrounded by short deckchairs all glowing empty at 5pm whilst inside old men huddle individually over the sport section of evening papers and the waiters lean on the bar chatting passionately about something that does not matter at all.

I take my usual seat and wait for Alex, the waiter, my friend. I have been coming to this restaurant everyday since I arrived, over three months now, and it feels to me more homely than my rented apartment. On the table I lay my normal belongings; a cracked and scratched mobile phone that rings maybe once a week but never when it is near me, a packet of Camel Blues - one of its cigarettes turned up and therefore made lucky (I love irony more than I love anything else) – a half read novel I have read before (this week it is Kundera’s ‘Immortality’) and a disposable lighter that has been almost empty all week. Although I have had this paradisiacal setting almost every day and I soon took it for granted, there was something different about today, something even closer to perfection. The hot air had ceased suffocating the city and a weak breeze brushed the street; traffic had become strangely thin; numerous beautiful women stalked the shopping arcade, one of which had even given me an uncommon look of surprised attraction: yes, it was a good day to be me.

Alex and I, in my slow and repetitive Spanish, have had and keep having the same conversation everyday. He is over sixty with rich grey hair that softly falls from the middle of his head to below his ears, an elegant man who moves with smooth accuracy and always gives me a smile of genuine, although sometimes puzzled, affection. The conversation goes like this:

Alex: Andres, how are you?
Andrew: Alex, everything is good, and you?
Alex: Perfect! Is it too hot for you Englishman?
Andrew: No, never! But do you have a cold beer?
Alex: Cold? It is frozen!
Andrew: Perfect, one frozen beer please and the menu (although I already know what I will have.)
Alex: Of course, sir.

As he returns into the cool dark of the café’s insides, I breath out a full breathe and look at the main street one block away: to my minor surprise I see the woman who served me at the post office this morning cross the street in a mild rush, perhaps anxious to get home to waiting children, or a cooling shower, or just not to crushed flat by the oncoming traffic. These insignificant links in life’s tapestry is one of my chief joys; the little coincidences only I see and when expressed to anyone else would seem paltry and dull. To me, however, they are fascinating.

Alex returns with my beer and the ashtray he knows I would ask for. I give the menu a quick, fake look, just to make sure they haven’t added or subtracted anything, something they haven’t done since the restaurant opened over fifty years ago.

Andrew: I’ll have the ricotta cannelloni with the Bolognese sauce, please?
Alex: A wonderful choice, sir. You know all the pasta and sauces are made right here in the morning? (Yes, primarily because he tells me this everyday and it is one of the reasons I give the owner the majority of my money.)
Andrew: Yes, thank you.
Alex: Did you watch the Boca game last night?
Andrew: Of course! (Although I didn’t and rarely do, but always read up on the results for this precise occasion.)
Alex: Ah, it is too bad!
Andrew: Yes, they miss Gago, no?
Alex: Yes, he is a great player, and Real (Madrid) do not use him. It is too bad! (And with the look of a man who has just remembered in aching lucidity the first time he made love to his first love, he returns inside to pass on my order.)

I lean back, satisfied with another successful conversation in Spanish (although if he had varied even slightly off the script I would have been sent flying to my dictionary) and I see what I can see; the harsh sunshine streaming onto the pavement floor, the pot plants waving at each other in the weak wind, the dozens of women carrying shopping bags walking in front of their men who no doubt would have given a kidney to swap places with me rather than be taken to another clothes store (shopping in Buenos Aires is a daily religion). Briefly, my mind remembers my ex-girlfriend, wondered what she would have ordered, what she would have said. A Danish beauty with a five word name whose brutally humorous impression of my British accent – with a torrent of R’s after every shotgun barrelled vowel – never failed to make me smile, even when, as per usual, she was driving me crazy. Then she is gone and I am glad she is not here, monopolising the conversation with Alex in her perfect dialectic Spanish, leaving me to pretend to read the blurb of my book with sudden unexpected interest until he walks away, giving me a quick smile that says at the same time “Women! They talk like a river runs!” and “If you got your nose out of your fancy novels and studied that book of Spanish verbs we could have a proper chat for once!” Or something like that.

It is then that thoughts of the future, both of fear and freedom, rise within me. In a week my time here will end and I will move to Brazil, to Sao Paolo of all places, to become a stranger in a strange land once again. I find it remarkable that all the things I thought I had to do in my youth, now that I have done them, did not need to be done, and have brought with them few epiphanies and little clarity. Of course they had to be done, or I would be still dreaming of them but without the opportunities to do anything about solving them, a far worse situation. But I am hopeful for Brazil, if only to meet again one of the few women who have come close to the person I have been dreaming of for my last ten years, since women entered my head and refused to leave. Deep down I realise that we will never meet again but that does not stop my mind picturing her in front of me now, imagining a funny argument we might have as I watch her hair dance in the air. I return to Kundera.

Alex returns with my food and it is as good as I hoped it would be, as good as it was yesterday. He is a very proud man, like all Argentineans, and delighted that a man from as far away as England is so taken with the food he serves. While I eat he watches me from the corner of his eyes, desperate to talk to me about his beloved Boca Juniors even though I would only understand a small percentage of his words, would only ever be able to agree.

When I have finished my food, smoked a celebratory cigarette and have generously tipped him – a whopping two pounds - I sit back in my chair and take a moment before walking the two minutes back to my - thank God - air-conditioned apartment and almost finished novel that has been almost finished for over five weeks now. I think that when I leave I will miss Alex and Café Latinita more than anything else in Buenos Aires; more than the constant sunshine and conveyor belt of beautiful women, more than the afternoon naps and all night parties, more than the people I have met, more than the woman who became my girlfriend.

Walking home I stop and look at the table where I had eaten: my once cold beer stands empty next to the crowded ashtray and half full basket of fresh bread, my chair at an angle to the table, as if someone was soon to return to their seat. And then I realise I will never come here again.

Elle sait (para Ju e Danilo)

“Você sempre pensou que, em matéria de amor, não amar demais era um meio seguro de ser amado. E você se enganou, meu pobre Federico.” Enrique Vila-Matas

Beatriz não conseguia ficar triste, talvez ficasse um pouco aérea. Não sabia se era o remédio que tomava para a ansiedade ou se era a sua maturidade dando sinais de existência. Será que o tempo a endureceu? Se fosse há um ano ela se veria envolta a uma poça de lágrimas e se fecharia para tudo. Sozinha com seus livros e filmes esperando a dor passar.

Ultimamente ela parece saber o que quer. Estranho - ontem quando conversava com uma amiga que há tempos não via, alguma coisa estalou e depois ecoou em sua cabeça. “Sabe, Beatriz, quando a gente sabe o que quer tudo muda.”

E não é que mudou e ela nem tinha dado conta disso? Não dá para saber tudo, mas ela já sabe algumas poucas coisas que quer.

Porque é tão difícil saber o que quer? Parece que nós desviamos do verdadeiro desejo e colocamos uma lista de coisas materiais e impossíveis na frente. Beatriz costumava fazer listas: um jeans, um tênis colorido, blusas, livros, vestido tomara-que-caia, vestido estampado, saia no joelho, saia na coxa, namorado bonito, inteligente e rico, começar dieta, entrar para a academia, perder dois quilos, mudar de emprego, mudar de profissão, mudar de país, mudar.

Quem tem tempo (e espaço) para pensar no desejo mais íntimo com tanta besteira na frente? Há um mês economizando dinheiro para uma viagem que ela verdadeiramente quer, Beatriz está descobrindo os prazeres gratuitos e toda essa simplicidade a coloca em contato com ela mesma. O muro de excessos que existia entre ela e o espelho foi trocado por um véu de seda. Beatriz ainda não se vê totalmente, mas já enxerga suas formas, sua silhueta e dois brilhos começam a emergir em seus olhos.