Wednesday, August 26, 2009

O buraco que ficou

Antes que Nicole partisse pela última vez da casa de Leonardo, ele quis deixar uma recordação sua com ela.

- Toma, esse é o meu preferido.

- Não vai ter dedicatória?

- Ah, é claro, espera aí que eu vou fazer.

Enquanto ele escrevia, ela andava pela sua casa olhando tudo que não veria jamais. O sofá-cama aberto em frente a televisão, a estante com os mesmos DVDs, o baleiro, o desodorante e a foto da outra mulher que o abraçava.

- Toma, espero que goste. Nicole não via nenhuma verdade nos seus olhos, o que ela via era um alívio que dizia baixinho: vá logo. E foi-se.

No caminho para casa sentia-se aliviada também. Aquilo tudo era ilusão. Faltava muito em Leonardo. Nicole tinha certeza.

Leu a dedicatória do livro mais uma vez e a achou tão genérica... “te dou este livro porque é o meu preferido...”, palavras pobres em uma letra bonita. Nicole preferiu virar outras páginas. O predileto de Leonardo ficou na estante acumulando poeira. Ela tinha horror e medo de abri-lo e encontrar aquela dedicatória sem sal.

Quando ela deixou a casa dele se sentiu tão aliviada, onde se encontrava essa sensação agora? Pensava nele descuidadamente. Parece que o tempo desbotou sua razão.

Numa madrugada de insônia, levantou-se da cama e ficou parada de frente para a estante de livros encarando o “preferido”. De impulso, retirou o livro com violência e foi direto para a dedicatória. Nada tinha mudado. Aquelas palavras continuavam ridículas. Pôs-se a lê-lo.

Primeiro capítulo, nada. Segundo, nada, terceiro, quarto, quinto, sexto... nada. Não é que Nicole procurava respostas no livro? Foi se envolvendo, gostando do enredo e algumas respostas começaram a aparecer. Encontrou até seu personagem. Que decepção! Nicole era um buraquinho. Sim, esse era seu papel no livro. Ficou chateada com a comparação que ela mesma fez. Será que ele pensava assim? Pode ser, mas nesse caso a história é dele. E Nicole será um buraquinho que não foi escavado suficientemente.

7 comments:

Cristiano d'Alcântara said...

Demoiselle,

confesso que seus textos revelam muito da sua essência. Que eles ecoem e sejam verdadeiros da mesma forma que suas risadas sonoras e suas palmas tão características e que te fazem única.

Bjo e espere que encontre um vento que balance sua alma e refresque seus sentidos.

Carina said...

Obrigada, Cris!
Ando a espera de um vendaval hehe

beijos

Lo said...

Vendaval? Deu na meteorologia que vai ventar muito em Ouro Preto em setembro...

Carina said...

aaaeeee dona lô! saudade da senhorita!

Isabela said...

As vezes os buraquinhos escondem grandes segredos...é o que dizem os arqueologos!

Carina said...

Os arqueólogos têm razão!

schwenck said...

tampar o buraco é sempre dificil, mesmo que a gente nao se lembre dele ou queira com muita força tampar.
E uma hora, a gente cai nele de novo se nao toma muito cuidado.